terça-feira, 3 de novembro de 2009

A classe C está com tudo



JEANS – Consumidoras preferem calças justas e de cintura baixa




DECOTES – Em alta, roupas que deixam partes do corpo à mostra


Todos os olhos do mercado voltam-se para os hábitos de 86 milhões de pessoas, quase a metade da população

Duas pesquisas, uma da CO.R Inovação, empresa de branding, e outra da agência Mc Cann Erickson, derrubam alguns estereótipos acerca da emergente classe C, como a ideia de que esses consumidores gostariam de fazer compras no comércio mais sofisticado ou de que seguem a moda à risca. Nem uma coisa nem outra. Segundo um estudo feito em março pela Mc Cann Erickson – mil questionários com casais entre 20 e 65 anos, de Recife, São Paulo, Rio, Porto Alegre e Goiânia –, 68% dos entrevistados sentem-se desprezados pelos ricos e 55% declaram ser avessos a produtos comercializados em lugares considerados chiques. "É curioso perceber que a classe C deseja consumir mais, porém não demonstra a preocupação em mudar de classe", afirma Aloísio Pinto, vice-presidente de planejamento da agência.

Na hora de ir às compras, as amigas são as grandes conselheiras (28,2%), seguidas por profissionais dos salões (21,6%), revistas (20,7%), novelas e filmes (7,8%). Poucos fazem uso do cartão de crédito, com medo de endividamento. O uso moderado do cartão faz parte da realidade de 67% dos entrevistados, e o contingente dos que não possuem conta corrente ultrapassa a casa dos 30%.

Já no campo da moda, como observa a publicitária Mari Zampol, diretora da CO.R – que mapeou o comportamento de consumo de famílias paulistanas com renda entre R$ 1.115,00 e R$ 4.807,00, universo que compõe a classe C, segundo parâmetros definidos pela Fundação Getúlio Vargas – as passarelas do São Paulo Fashion Week, bem como os padrões de beleza que enaltecem o corpo das modelos, não fazem a cabeça das jovens (200 entrevistadas, entre 18 e 25 anos). "Elas não cobiçam ser loiras, magras e ter 1,80 metro de altura. Procuram figuras femininas que tenham um pouco delas. A identificação está nas semelhanças, e não nas diferenças. Quero ficar bonita e gostosa é a frase mais ouvida", observa. Mari pediu às entrevistadas que abrissem seus armários e, assim, mais uma surpresa:

– Enquanto nas classes A/B o chique é descoordenar cores , na C elas fazem questão de combinar bolsa e sapato. Além da segurança do acerto, passam a ideia de que se dedicaram na hora de se arrumar. O brilho que aparece no jeans se repete na alça da bolsa. A lingerie é um item especial. Muitas vezes, a produção começa pelo sutiã e sempre com um detalhe aparecendo, como a alça ou uma parte do bojo de oncinha. E aí o sapato ou cinto vai ter um detalhe da mesma estampa. Também é comum colocarem um sapato dentro da bolsa, no caso de saírem depois do trabalho, já que as distâncias entre um ponto e outro são longas e não compensa voltar para casa e se trocar.

As informações correm mais pelo boca a boca do que por meio de jornais e revistas: "As novelas causam impacto e, praticamente, todas acessam o Orkut." E, ao contrário das classes A e B – com as quais tem, como único ponto de concordância estético, o cabelo liso e chapado –, não há uma preocupação em abastecer o guarda-roupa com grifes, nem de seguir tendências que não valorizam o corpo. "Um exemplo é a calça saruel, rejeitada pela maioria das entrevistadas por esconder as formas. Preferem os jeans justos de cintura bem baixa."

Lenços, echarpes, sobreposições, enfim, tudo que cobre muito partes do corpo não é com elas: "No quesito acessórios usam muitos enfeites de cabelo, flores, presilhas e também investem em bolsas, sapatos e muitas sandálias". O nude, nova coqueluche fashion, nem pensar: "As consumidores da classe C não têm nenhum problema em usar cores. Para elas, o colorido ajuda a valorizar a beleza de cada uma como olhos, cabelos, pele. Outro motivo é que o branco, depois de tomar quatro conduções, não rola". Para bater perna, as moradoras da Zona Leste, por exemplo, gostam dos shoppings da região com preços mais acessíveis. Outra opção é o comércio dos centros atacadistas, como Brás e Bom Retiro. "Vão em grupos, quando a compra envolve uma festa ou evento especial."

VAREJO AQUECIDO

Algumas lojas de varejo se consolidaram atendendo essa fatia de mercado, caso da tradicional rede Riachuelo, como observa José Antonio Rodrigues, diretor de Crédito e Risco: "Estamos sempre atentos aos movimentos dessa classe social, que cresceu muito em tamanho nos últimos anos, influenciada principalmente pela migração das classes sociais D e E." Segundo Rodrigues, o mais importante desse movimento é o aumento do poder da classe C no consumo interno, impulsionado pelo aumento do crédito, facilidade de pagamento, aumento do salário mínimo e maior participação da mulher na renda familiar.


Uma das três maiores redes de varejo de moda do País, a Riachuelo conta com 104 lojas distribuídas por todo o Brasil. A faixa etária do público consumidor concentra-se entre18 e 37 anos, sendo 75% das classes C, D e E, fazendo jus ao slogan "moda ao alcance de todos". No mailing, há 15 milhões de clientes, 61% de mulheres. Segundo José Antonio Rodrigues, outra importante característica da empresa é a concessão de crédito para essa classe social há mais de 20 anos, por meio de seu cartão private label.

BONS PREÇOS

O Bom Retiro atrai pessoas vindas de bairros distantes, atrás de preços e novidades. A dona de casa Marta Chaves, mãe de três filhos com idades entre 8 e 20 anos, mora na Água Fria e foi até a rua José Paulino comprar roupas para as filhas adolescentes. Na banca de saldos, tentava achar alguma peça que "fosse a cara" das meninas. "Gosto de vir aqui porque tem muita variedade, bons preços e qualidade", afirma.

Andando apressadas rumo ao trabalho e com roupas idênticas (jeans justos, botas pesadas e casacos de náilon), as amigas Luciana de Oliveira, moradora da zona oeste, e Marilia Nunes, de Ferraz de Vasconcelos, compram uma vez ou outra no bairro, apesar de trabalharem na região. "Quando saímos, as lojas já estão fechadas, mas no caminho às vezes dá para ver uma ou outra peça", dizem. Marilia, com cabelo escorrido, enfeitado por uma flor, e blush pink carregado nas maçãs, conta que adora maquiagem e que reserva uma quantia por mês para roupas e cosméticos. Já Luciana, mãe e chefe de família, é mais comedida nos gastos. Para elas, calças boy friend e saruel, de modelagem ampla, não estão com nada. "Preferimos jeans que valorizam mais o corpo." Fonte de inspiração? "Seguimos uma moda própria mesmo", falam acrescentando que nunca copiaram looks de novelas.

Também as lojas de departamentos atraem as consumidoras, que, em sua maioria, parcelam as compras no cartão exclusivo das lojas. Usando jeans, bolsa transada, lenço de seda no pescoço, bijuterias vistosas e maquiagem caprichada, a advogada Karoline Modesto aproveitou a hora do almoço para olhar as novidades de moda na C&A do shopping West Plaza. Consumista assumida e fã número um da controversa calça saruel, conta que se informa por meio da TV e de revistas femininas. "Além da moda e dos preços, a vantagem de comprar nos magazines é que a primeira parcela vence em 60 dias", conta.

Olhando a seção de biquínis, a consultora de beleza Neide Rodrigues disse preferir o conforto dos shoppings. "No Bom Retiro há poucas lojas com provadores", justificou, contando que se identifica com o estilo esporte social de Patricia Poeta, apresentadora do Fantástico, programa da Rede Globo. Usando jeans justo e top de alcinhas, apesar do friozinho da manhã, disse ainda que não gosta de "roupas fechadas".




NOS PÉS – As sandálias anabela não podem faltar nas produções

Fonte: Vera Fiori - O Estado de S.Paulo

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