terça-feira, 15 de setembro de 2009

Guto Índio da Costa - Nesta entrevista, o designer fala sobre o momento atual, sobre design brasileiro e sobre o sistema de transporte público TEX



Quando o assunto é design brasileiro de sucesso, Guto Índio da Costa é do time dos profissionais sempre lembrados. Diferentemente dos irmãos Campana, contudo, sua atuaçãoé própria da escala industrial, seja no segmento popular ou de luxo. Os exemplos são seus projetos para lavadoras de roupas e fogões de baixo custo e, na outra ponta, o desenho de equipamentos com eletrônica sofisticada.




A crise financeira afetou o planejamento do seu escritório?



Alguns clientes adiaram projetos que estavam para começar, mas posso dizer que a crise não nos afetou diretamente. Ou melhor, causou-nos até um efeito inverso, porque no momento da crise os empresários se obrigam a repensar suas estratégias, seus produtos. Enquanto está todo mundo vendendo, a preocupação é só produzir, produzir e produzir. Houve, então, clientes que aceleraram os projetos conosco. Cortaram os seus custos extras e focaram no lançamento de produtos. Muitos deles concorrem com equipamentos importados, que foram muito afetados tanto na Europa quanto nos Estados Unidos. Os brasileiros identificaram nisso uma oportunidade é uma estratégia interessante.



A indústria de luxo foi a menos afetada?


Acho que o segmento popular não sentiu nada da crise. Pelo contrário, o IPI em baixa tornou a situação até favorável.


Qual a relação proporcional desses segmentos de projeto no seu escritório atualmente?



Eu não saberia dizer. Temos trabalhado muito com projetos de alta tecnologia, com equipamentos sofisticados, destinados às transações bancárias, por exemplo. Mas também trabalhamos com o segmento popular, produtos do dia a dia. Acho que a crise traz imensas oportunidades, pois os industriais têm que ser mais competitivos.


O cenário só não é favorável para o tema sustentabilidade, o primeiro a ter orçamentos cortados, não é verdade?


Isso é uma pena. Uma das repercussões positivas do fato de o barril de petróleo ter batido em 140 dólares foi viabilizar fontes alternativas de energia. Até a energia solar começava a se pagar naquele contexto. Agora, com o preço despencando novamente para cerca de 40 dólares o barril, foi refreado aquele impulso enorme na direção de outras fontes energéticas. Também as empresas quando se desestabilizam deixam de lado aquilo que consideram menos emergencial.

Que funções pode desempenhar o designer nesse cenário?


Tenho percebido a disseminação da expressão design thinking, que é o raciocínio do desenho levado a outras áreas. No design, para que seja gerado algo novo, o raciocínio utilizado é ainda aquele que aprendemos na escola, baseado no erro e acerto. Você é punido pelo erro. O raciocínio lateral é o oposto, baseado em um exercício enorme, repetitivo, em que se enxergam alternativas inovadoras a partir do erro. Isso está começando a influenciar uma série de outras áreas, inicialmente a dos negócios. É o design entrando cada vez mais nas decisões estratégicas. Acho que seria fantástico se os designers atuassem na política, mas, pelo menos no Brasil, essa é uma área ainda tão hermética! Seria sensacional se eles pudessem canalizar a sua criatividade em busca de soluções que melhorassem a qualidade de vida das pessoas. Teríamos muito com que contribuir.


Há, então, potencial para o designer no domínio público?


É algo que vai acontecer. A Califórnia, por exemplo, sempre esteve aberta a esse tipo de atuação. Lá, há muitos anos já estimavam que parte dos carros deveria ser elétrica, não poluente. De certa forma isso foi cumprido, por consequência da lei. Estive na Califórnia há uns dois anos, no primeiro seminário sobre mobilidade urbana sustentável, e a discussão era toda voltada para a reversão do uso do carro individual, considerado um modelo falido. As cidades estão hoje completamente dominadas por automóveis, as garagens tomaram proporções imensas, os prédios por vezes são distantes da rua porque têm andares e mais andares de estacionamento. No seminário, durante três dias, cientistas, físicos, químicos, designers, gente da indústria e políticos discutiram alternativas a esse modelo.


O senhor apresentou algum projeto naquele seminário?
Sim, apresentei o projeto do Tex.

Houve receptividade à ideia?


O público reagiu de forma extremamente positiva. Foi curioso porque, na época, eu imaginava que o seminário apontaria uma porção de soluções para a questão da mobilidade urbana, mas o que se fazia era discutir o problema o tempo todo. Minha apresentação foi a única a indicar uma solução urbana, de maior escala e inovadora. De resto, eram soluções já conhecidas, como a que pensa em automóveis comunitários. Ou seja, a ideia é alugar carros elétricos, não poluentes, equipados com baterias que seriam carregadas por coletores de energia solar instalados no corpo dos edifícios. Outra proposta que achei inteligente, e que tem a ver com a comunicação instantânea, revolucionava o uso dos aparelhos celulares. Los Angeles tem faixas nas vias urbanas exclusivas para carros que transitam com mais de um passageiro, e tiveram a interessante ideia de promover a comunicação entre essas pessoas para que, através de uma central de informações, fossem formados grupos com trajetos compatíveis. Li recentemente num jornal que em Nova York, por exemplo, está em discussão a proposta dos táxis comunitários, que teriam sinalizado o seu destino para que passageiros pudessem compartilhá-los. Haveria até destinos preestabelecidos, como acontece com os ônibus, com o pagamento de uma taxa fixa pelo passageiro, algo como três ou quatro dólares. É sempre uma questão de aproveitamento de espaço, principalmente para os americanos que têm aqueles carros enormes. Acho que há muitas soluções para serem testadas.


Quantas vezes o senhor apresentou o projeto Tex em seminários e reuniões com empresários e políticos?


Não sei, já perdi a conta.


Tenho percebido a disseminação do design thinking, que é o raciocínio do desenho levado a outras áreas. Seria fantástico se os designers atuassem na política, mas no Brasil essa área ainda é hermética. Teríamos muito com que contribuir.

Fonte:http://www.arcoweb.com.br/entrevista/guto-indio-da-costa-nesta-entrevista-14-09-2009.html

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